O recente episódio de ataque à base de fogo a postos do Ibama e Instituto Chico Mendes (ICMBio) no município de Humaitá, no sul do Amazonas, revelou muito mais do que uma revolta popular contra uma fiscalização que não é feita como procedimento padrão, mas pontual e direcionada.
Desnudou que o governo central do Brasil está de costas para a Amazônia.
Se em todo o país o ICMBio, que perdeu sua sede para as chamas em Humaitá, tem um agente para fiscalizar quase 800 mil quilômetros quadrados nas unidades de conservação ambiental, no Amazonas o quadro é assustador.
Em apenas duas unidades, os parques Mapinguari e Campos Amazônicos, cada um dos seis agentes do ICMBio teria mais de 4,5 milhões para vistoriar nos 27,4 milhões de metros quadrados dessas duas reservas.
Ou seja, é um continente sem vigilância.
Não bastasse o governo federal não ter pessoal suficiente, a distribuição da mão-de-obra disponível pelo governo é feita de forma discricionária para a Amazônia.
Para um parque de 961 mil hectares, na divisa de Amazonas e Rondônia, o ICMBio tem dois agentes. Já em Brasília, no parque de apenas 42 mil hectares, são 27 os fiscais.
Contribui para o esvaziamento dos órgãos ambientais a falta de incentivo e atrativos para quem queira servir em postos instalados em áreas inóspitas e de conflito com madeireiro, fazendeiro, garimpeiro.
E não é só isso: esse servidor público está vulnerável em sua segurança pessoal e é um alvo em potencial da corrupção.
“Em áreas da Amazônia, mais isoladas, com ação dos madeireiros, há ameaça à integridade física dos trabalhadores”, afirmou agente do ICMBio no Pará.
O que aproveita ao amazônida viver em uma região de mais de 3 milhões de quilômetros quadrados de floresta, que é quase 70% de tudo que existe no mundo?
Também de nada vale para o país a importância da região para o controle da temperatura no planeta.
E sobre as riquezas minerais, que saem do país de forma clandestina, mas não podem ser exploradas para o desenvolvimento das populações amazônicas?
Como o potássio da silvinita do Amazonas, que tem potencial para tornar o país autossuficiente por pelo menos 100 anos, mas que não se vê boa vontade do governo federal em providenciar sua imediata extração.
O mesmo governo que não dá nenhuma importância para o fato dos moradores da Amazônia pagar mais de R$ 70 por uma botija de gás de cozinha de 13 quilos e mais de R$ 4 por um litro de gasolina quando o petróleo e o gás são retirados do seu próprio solo.
E acrescente-se que Manaus tem uma refinaria de petróleo e um gasoduto de quase 400 quilômetros que até hoje não justificam ao bolso da população suas existências.
Que tal o tratamento dispensado aos povos indígenas, jogados à própria sorte em suas próprias terras?
E o que falar da diversidade dos ecossistemas da fauna, da flora, a mais rica do planeta?
A resposta a todas essas indagações é simples e única: o Estado brasileiro, gestor dessa fortuna, não sabe e nem está interessado em cuidar dela. A Amazônia não tem sido honrada com a atenção merecida.
Até mesmo o modelo zona franca, criado pelas gestões militares para ser uma espécie de compensação pelo abandono histórico da região pelo governo central, que não consegue ver o Brasil além das regiões Sul e Sudeste, é alvo constante de ataques, até mesmo pelo “fogo amigo”, que lhe contingencia os recursos, deixando-o à míngua.
De tanto tentar, um dia desses conseguirão acabar com ele.
Há muito a Amazônia clama por socorro. Os massacres nos presídios da região, cada vez mais comuns e que podem se repetir na hora e momento que os criminosos quiserem, não conseguiram sensibilizar o governo.
Tanto que a resposta que deu foi a de construir mais presídio. Não percebeu que a questão não se restringe ao setor carcerário, prisional. Antes, reflete o poder do crime organizado no comando das fronteiras do narcotráfico, na Amazônia.
E esses tentáculos já avançam na política, conforme alerta recente da autoridade eleitoral do país, e outros setores da estrutura do próprio Estado.
Já passa da hora de a Amazônia, por todas essas razões, e outras, ter um plano específico de gestão, desenvolvimento e proteção. Afinal, aqui se está tratando de 60% do território do Brasil, cada vez mais, e perigosamente, vulnerável.
Noticia O Globo que o futuro, desgraçadamente, é nada promissor para o setor ambiental. O governo federal prevê para 2018 um orçamento que é menos da metade do recurso deste ano.
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Foto: Reprodução/internet